segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Respirar e (se) (re) inventar

Talvez a situação mais difícil, a mais dolorida que um ser humano possa passar, seja a dor de nascer. Sabe, nascer, por a cabeça pra fora nesse mundo e respirar. E quando todos dizem que respirar é fácil, eu discordo. Totalmente.
Não porque eu me lembre de algo de quando eu nasci, não me lembro. Talvez me lembre inconscientemente ou por fotos que vejo da minha mãe ainda bem novinha e do meu pai com todos os cabelos pretos.
Mas digo com toda certeza que respirar não é fácil. Não é.
Respirar dói, colocar essa cara no mundo, enfrentar esse mundo do jeito que tem que ser enfrentado, sendo valente, dói.
Para mim acho que além do processo de respirar, de nos colocar como somos nesse mundo que estamos, o mais difícil é também saber respirar, sim. Não me venha dizer que é básico. Está bem, todos nós respiramos, o bebê quando nasce dói, mas respira sim. Mas saber respirar nos momentos de grande agitação é díficil.
E a agitação não precisa ser externa, de muita gente. É saber respirar nos momentos de agitação interna, quando tudo parece tão fora de lugar, tão desordenado, que duvidamos que o ar que estamos respirando seja ar mesmo, ou melhor, esquecemos como fazer para encher o tórax e a barriga de ar e ir soltando, lentamente, só o que está acontecendo agora.
É difícil respirar, sim. E mais difícil ainda respirar o agora. O bebê respira o que está acontecendo, esse ar denso que entra dentro dele e a fome, a vontade de comer e sem saber como. Antes, tudo tão fácil dentro da barriga da mãe, tudo tão pronto. E agora? O que fazer, como fazer? Se acalma naquele seio e naquele leite, respira devagar e pronto. Para o bebê dói o momento, a fome do momento, a cólica do momento, a fralda suja do momento.
Para a gente, dói o futuro, dói o que ainda nem aconteceu, dói não conseguir ficar com o momento, com  o que está acontecendo, isso dói. O caos externo fica pequeno, porque, apesar de tudo arrumando, milimetricamente organizado e limpo, com cheiro de limpeza, as frutas picadas, a louça lavada, a roupa dobrada e os livros organizados por ordem de autores, o caos interno de pensar sem parar no que ainda vai acontecer, desordena, deixa tudo no ar. Te faz doer ao respirar.
E é disso que quero falar, do peito vazio de ar, quando parece que lhe falta o mínimo para sobreviver que o caos te desmonta e te diz: essa é a vida. Não há peito materno. Não há o que ser feito.
Apenas partir, andar em buscar de reinventar o que já se sabe. Aquela folha de papel em branco que pode virar um poema, que pode virar um origami, que pode virar um texto. Nunca igual. Nunca.
E é nesses momentos que a única coisa que temos é a insegurança de se reinventar. É bem mais fácil ficar onde se está. Bem mais fácil.
Mas é importante nascer. E depois de respirar dolorido, quando te tiram do melhor lugar do mundo, é hora de renascer. E como isso dói. Acho que dói mais do que nascer porque ao nascer o esforço físico é compensado pelo leite quente, é compensado por dormir horas a fio. Mas renascer é difícil. Porque esse parto só depende de você mesmo. E de como você vai cortar o cordão com o que chamamos de "segurança" e finalmente, fincar os pés no chão. Pertencer, no caso, a você mesmo.

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