terça-feira, 14 de abril de 2009

Telefonema

"
- alô? por favor, gostaria de falar com o Marcel.
- quem gostaria?
- é a carolina.
Marcel, telefone. Carolina. Sim, Carolina.
- Carol?
- Marcel, desculpe. Sei que faz anos que não nos falamos. Queria muito conversar com você.
- Está tudo bem?
- Sim, está sim. E com você.
- Tudo bem também. Mas diga, o que acontece?
- Como está sua vida?
- Bem, já disse que bem.
- E o namoro?
- Carol, não quero falar sobre isso com você. Não mesmo.
- Mas prometemos ser pelo menos amigos...
- Sinto muito. Não consigo ser seu amigo. Tentei, nos vimos de novo, vimos, revimos e acabou. Acabou. Não tem mais nada, Carol. Temos que parar com isso.
- Sim, eu tentei. Mas às vezes a vontade de falar com você volta com toda a força do mundo e parece que não me perdoei por nada.
- Perdoar do quê?
- De tudo que lhe fiz.
- Carol, eu estou bem assim. A distância é a melhor coisa pra gente.
- Escuta, por favor, me escuta. Eu preciso lhe falar. Tem mil coisas doendo, queimando aqui dentro de mim. Coisas que nem sei de onde aparecem. Dores de encontros que não aconteceram, palavras que não dissemos.
- Carol, chega, para com isso. Está te fazendo mal...
- Eu sei. Guardar isso é que está me fazendo mal. Me escuta....
- Carol, por favor...
- Pela última vez, me escuta: tudo que eu fiz foi por não saber o que fazer. Demorou. Demorou, mas eu vi. Sabe o que eu fiz ao terminar com você? Terminei comigo mesma.
- Carol...
- Só me escuta! Terminei comigo. Terminei com você quando descobri que estava apaixonada por você. Sim...estranho isso não é? Quem em seu juízo faz isso? Eu. Eu fiz isso. E sabe porquê?
- Diga...
- Porque achava que nada que fosse tão bom assim era para mim. Nada. Veja bem, você, um cara mais velho, cheio de ideias, vida. Inteligente, engraçado, apaixonante, carinhoso. Pra mim? Como assim? Eu não mereço isso...
- Você vivia em extrema punição de si mesma...
- Vivia não, eu vivo. Parece que quanto mais eu olho para os lados, mais não me vejo, não me encontro em olhar algum. Vejo apenas sombras, e com uma dificuldade imensa vejo algumas vezes, a luz sobre a folhagem, a copa da árvore.
- Carol, eu gosto de você. Gosto muito mesmo, mas ficou para trás. Tudo aquilo que sentia, acabou.
- Não estou lhe culpando, nem lhe cobrando. Estou falando de mim mesma. Dos meus medos. Dos meus tormentos que sempre voltam a zombar de mim.
- Estamos há anos sem nos falar, Carol, anos. Você não tem esse direito. Chega, acabou mesmo. Preciso desligar...
- Espera Marcel, espera. Ouve isso.
- Ouvir o quê?
- Isso....
- Carol, não estou ouvindo nada...
prece, palavras ditas em voz baixa.
- Carolina! Carolina!
- O que, meu amor?
- Que som foi esse?
- Essas palavras são minhas, disse-as em voz baixa, para mim mesma. Estou me perdoando pelo que fiz. E também pelo que deixei de fazer. Estou esquecendo você....
- Você me magoou imensamente. Foi dolorido demais para mim. Me machucou forte duas vezes. Duas, Carol, duas. Você tem noção do que é isso?
- Marcel, a vida é assim. Eu também já fui magoada, algumas vezes, humihada. Temos que aprender a viver com a dor. Essa dor delicada, esse processo chamado "vida". Se perdôe. Estou me perdoando também. Fica em paz. Só precisava ouvir sua voz, lhe dizer isso. Ou melhor, me ouvir dizendo isso.
- Carol...
- Sim?
- Carol...."

Um comentário:

Anônimo disse...

nossa, texto lindo e angustiante...daqueles de tirar o chão!