segunda-feira, 11 de outubro de 2010

A Frente Fria que a Chuva Traz

Cena da peça: A Frente Fria que a Chuva Traz
A genial e visceral Fernanda D'Umbra em cena como a divina Amsterdã
Fernanda e Mário Bortolotto
O nome desse post bem que poderia ser atribuído ao que vive em São Paulo na última semana. Choveu. Choveu muito. E entre uma chuva e outra, um vento frio se acumulava nas esquinas da Augusta. E eu senti frio também. Muito frio.
Claro que agora será um tanto difícil para mim escrever tudo que vi e vivi esses quatro dias que fiquei lá. Sempre volto de São Paulo triste e feliz ao mesmo tempo. Um paradoxo, é claro, como tem sido a minha vida.
Volto triste de ter que deixar para trás aqueles litros que cultura que impregnam na minha alma quando estou lá. Raramente consigo dormir bem e muito. Quero aproveitar tudo como se restasse apenas um gole. O último gole. E volto para cá, para a cidade onde nasci e vejo que lamentávelmente estou ilhada nas minhas ideias e vontades.
Enfim, por isso eu volto triste. E também volto feliz porque as coisas que vejo, assisto e ouço alimentam a minha alma de vontades e expectativas. Me fazem ver que posso me sentir viva, dolorida no choro compulsivo em uma exposição sobre o câncer de mama belíssima e aterrorisada com o filme canadense "eu matei minha mãe" (isso é para um outro post) e delirando com a peça genial do Bortolotto que assisti no Centro Cultural Vergueiro por míseros cinco mangos.
Pois bem, achei aqui vários textos que discorriam sobre o intitulado teatro. Mas não vou reproduzí-los. Eu gostaria porque são textos maravilhosos que fazem jus ao que podemos chamar de teatro verdadeiro, que toca, o teatro real mesmo.
Mas eu estaria me enganando reproduzindo-os aqui. Sim, porque o que eu quero falar aqui não é uma crítica da peça, porque não tenho competência alguma para isso. O que eu quero falar aqui é que essa peça Bortolotto encenada nos porões do Centro Cultural devia ser vista por todos.
Esqueminha básico para todos entenderem: há uma festa em uma lage numa favela bancada por dois playboys movimentadas a drogas, sexo e bebidas. Bortolotto faz o papel de Vítor, o porteiro fechadão e Fernanda D'Umbra de Amsterdã, a mais porra louca de todos.
Bortolotto quase não fala, apenas anda de um lugar para outro e olha com um olhar daqueles que só os grandes mestres podem fazer me cena. Fernanda ao contrário fala pra caralho, e se mostra monstruosa em suas falas, textos e ações de uma drogada sem rumo em busca do amor, ou da aceitação ou negação de si.
Contudo, enquanto eu via a peça me vinha a cabeça: caraca, esse cara quase morreu esses tempos e está aí, em pé, fazendo arte. E vendo a Fernanda eu pensava: genial. simplesmente isso, genial.
A cena em que ficam apenas os dois no palco eu posso reproduzir para mim como a mais especial: ela em um canto da lage, ele, Vítor o porteiro em outro e ela abaixada, sentada, falando sem parar sobre a necessidade de mudança de vida. De repente abaixa a cabeça e diz:
- a única coisa que que queria é que alguém me alisasse, dissesse que vai ficar tudo bem.
Vítor se aproxima e não consegue tocá-la.
tá, eu contando vcs me dizem: ahã. e daí?
e daí que é lindo. é cinema, é literatura e é teatro junto. Sabe porquê? porque mexe com aquilo de mais íntimo nosso: a necessidade do outro para sobreviver. nem que seja de um olhar.
que podemos encontrar na família quando temos uma, nos amigos e até mesmo em um porteiro.
"A Frente Fria que a Chuva Traz" é arrebatador. Nos coloca na situação de miseráveis, de vermes de uma situação a que somos convenientes: a situação de lavarmos nossa mão e dizermos "não tenho nada com isso".
Tem sim. tem muito a ver com isso. Com a situação desastrosa que está a sua própria vida. Você faz o que gosta? ou se questione simplesmente: está feliz? hã? me diga!
Terminou a peça e eu não conseguia parar de aplaudir. Fiquei sentada e a única coisa que queria era dar um abraço no Mário e na Fernanda.
Eu não consegui. Eles são super acessíveis. Mas eu não consegui. Quando estou frente a frente com esses caras que são tão grandes eu me convenço mais ainda de como sou pequena. A única coisa que consegui fazer foi fechar meus olhos e agradecer. Por estar ali, por ver a peça e por sentir o tanto que ainda tenho que viver e aprender.
Estava frio. Muito frio na saída. Tinha chovido...

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